Dá-lhe, Google!

                Na boa,  não sei como consegui viver sem a internet tanto tempo. Que maravilha que é.  A internet é maravilhosa, principalmente se você souber utilizá-la com bom senso e sabedoria.
        E o Google então, esse é MARAVILHOSO! Vou explicar porquê.
        Há alguns anos atrás, muitos aliás, estava na sexta série e lembro-me de uma crônica que  marcou-me muito. Uma crônica que abordava as diferenças entre as classes sociais. Contava a história de um dois garotos, um negro, outro branco. Um pobre, o outro rico. Embora a crônica tenha-me marcado muito e eu lembrar-me dela, esqueci-me do título e do autor, porém da crônica,jamais.
        Quando me tornei professora quis compartilhá-la com meus alunos, porém sem saber o nome e o autor, impossível, então todo colega de português que encontrava, perguntava se conhecia tal crônica. Ninguém!
        Com advento da internet comecei a buscar nos sites oficiais de grandes cronistas: Fernando Sabino, Rubens Braga, Stanislaw Ponte Preta etc. Nada! Quantas crônicas li, nem sei contar.
        Até que um dia, lendo um artigo do Millôr Fernandes na Veja, em que ele ressaltava a grandeza do Google, pude enfim, encontrar a crônica. No artigo Millôr dizia quão maravilhoso é o Google, “basta apenas colocar um verso da poesia e aparece a poesia inteira e autor”.      Então tive a ideia de colocar frases da crônica para ver se conseguia o mesmo resultado.  Digitei:  dois meninos, um branco outro negro. Nada.
        Se eu me lembrasse ao menos dos nomes deles... Digitei: Os dois jogam bola na praia. Nada. Foi então que pensei, tenho que lembrar-me de algo peculiar. Foi aí que me lembrei de digitar: “Seu pai tem carro?/ Não meu pai não tem. ?/Ah, o meu tem, meu tem um carro de campo, minha mãe um Oldsmobile... “e voilá,  o Google apresenta-me a crônica na íntegra: “Mal entendido”, Orígenes Lessa. Fantástico.
        Segue a crônica abaixo, ganhe cinco minutos da sua vida lendo o texto  a seguir, banqueteie-se com o dom  mais sublime a vida pode oferecer: saber ler. Você não vai arrepender-se.

Mal entendido (Orígenes Lessa)
                                                                                 
            Os dois garotos brincam na praia. Um branquinho, queimado de sol, olhos claros, quase negro de tamanho sol toda manhã. O outro, negrinho retinto de avós na senzala, de família no morro. Os dois descem à praia diariamente. O primeiro, de um nono andar, apartamento de frente, tapete no chão, lustres de cristal de muitas bocas, orgia de espelhos nas paredes. O outro, de um morro qualquer, barraco de madeira com São Jorge enfeitado de flor, um “dois-dois” de barro pintado, vaso de arruda na porta. Os amigos se encontram na hora certa, camaradagem de pé na areia igualitária. O primeiro traz bola. O segundo traz jogo. O primeiro é bem nutrido, atestado vivo de que caldo de vitamina batido em liquidificador é bom mesmo. O segundo é fino e sujo, os dentes inexplicavelmente claros e fortes, o riso irreverente, a gaforinha de areia sempre renovada nas pelejas da praia. Paulinho chama-se um, porque o avô foi Paulo e com ele começou a fortuna da casa. O outro chama-se Jorge, porque Ogum é padrinho.
            Descem os dois todos os dias. Quando Paulinho vem acompanhado pelos pais, Jorginho assiste, com um grave olhar de técnico aposentado, à pelada em que a censura familiar não deixa preto se meter. Quando Paulino vem só com a empregada – e é quase sempre – nem é preciso pedir licença. Jorginho tem lugar seguro, que ele é o artilheiro-mor da vizinhança. E a pelada se prolonga. Por ele, a manhã toda, a tarde toda. Não tem escola, não tem compromisso. Amendoim torrado ele só vende mesmo à noite, ora à porta do Rian, ora do Roxi. Mas ao fim de meia hora, de uma hora, a pelada vai se desfazendo. Parentes e empregadas vêm recolher os futuros Garrinchas, os Pelés e Zagalos em formação. Paulinho fica mais tempo. E, quando está só, ele e Jorginho descansam na areia. Inseparáveis na pelada – Paulinho arma o jogo, Jorginho apanha o couro e arremata de maneira inapelável – uma funda rivalidade os separam em tudo. Nunca se entendem. Porque Paulinho é importante, Jorginho um coitado. Paulinho vai à escola à tarde, de Cadillac. Jorginho vende amendoim na boca da noite. Oito anos, Paulinho. Nove anos, Jorginho. Reconhecendo a superioridade incrível do negro, no bate-bola, reclamando a sua colaboração, garantidora de gols, Paulinho se vinga depois. E com sua falta de diplomacia, tão própria da idade, faz valer os seus títulos, para humilhar o companheiro.
            - Tua casa tem tapete no chão?
            Resposta negativa de Jorge.
            - A minha tem. Até no quarto de empregada.
            E continua:
            - Tem lustre de cristal?
            Jorginho pergunta o que é. Paulinho explica. Jorginho não tem. Luz no barraco vem dos fifós. Um vidro de sal de fruta, o outro de Phymatosan.
            - Teu pai tem sítio em Petrópolis?
            - Não – responde sério Jorginho.
            - O meu tem...Teu pai tem usina em Campos?
            - Não.
            - O meu tem.
            - Teu pai tem iate?
            - Não.
            - O meu tem.
            - Quantos apartamentos teu pai tem?
            - Nenhum.
            - O meu tem dez. Só em Copacabana. O resto é na Tijuca.
            Jorginho baixa os olhos, acaricia o monte de areia que está juntando.
            - Teu pai tem televisão?
            Nos olhos de Jorginho passa uma nuvem de tristeza. Nem responde.
            - O meu tem – informa Paulinho.
            Apanha a bola molhada, procura limpá-la dos grãozinhos de areia, pergunta de novo:
            - Teu pai é deputado?
            Jorginho não sabe o que seja aquilo, mas diz que não, pelas dúvidas. Deve ser coisa importante.
            - Tem pai tem automóvel?
            Jorginho sorri tristemente, negando.
            - O meu tem – diz novamente em triunfo o garoto bem-nascido – O meu tem. Um JK 61 que eu vou na escola, um 62 que ele vai para a cidade, o Oldsmobile da mamãe, a camioneta do sítio, pra gente ir pra Petrópolis.
            Jorginho está completamente esmagado. Paulinho sorri orgulhoso. E agora Paulinho nem pergunta mais, apenas informa:
            - O meu pai tem 40 ternos de roupa, o teu não tem...
            Jorginho sente-se o menor dos moleques do morro.
            - O meu pai tem três casas de campo, o teu não tem!
            Jorginho sente-se o menor dos moleques do Rio.
            O meu pai tem dez cavalos de corrida, aposto que o teu não tem!
            Jorginho sente-se o menor dos moleques do Brasil.
            - O meu pai tem mais de cem milhões de cruzeiros, garanto que o seu não tem!
            Jorginho sente-se o menor dos moleques do mundo.
            - O meu pai é amigo do Governador, o teu não é, pronto!
            Jorginho sente-se o menor de todos os mortais.
            Mas Paulinho ainda não está satisfeito.
            - O meu pai tem retrato no jornal, o tem pai não tem, taí.
            É quando Jorginho pula vitorioso. Dessa vez tem resposta. Retira do bolsinho do calção rasgado um pedaço amarfanhado de jornal. Exibe-o, peito cheio, orgulho no olhar.
            - Isso não! O meu também tem.
            E em tom de desafio, irretorquível:
            - Tu pensa que é só teu pai que é ladrão?


            E então? Você acha que o “mal entendido deu-se porque Jorginho acredita que só os ladrões aparecem  no jornal ou que como o pai do Paulinho é político, ele é ladrão como o pai dele? Quem responder terá meio ponto na média. Comente aqui!

8 comentários:

  1. Prô eu acho que o Jorginho achou que o pai do Paulinho é ladrão tbm porque os políticos gostam de roubar os dinheiros da população.

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  2. Prô esse é o tesouro?Porque já vi todas as suas postagem é só achei essa.

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  3. Sim, Bia, vc ganhou meio ponto na média, o que não é pouco, já que ele pode virar um ponto. Por exemplo, se vc estiver com média 8. E eu te der esse meio, vc fica 8.5. Como não pode ter nota quebrada vc ficaria com 9. Parabéns, Bia, por alguns minutos vc ganhou do Pedro...

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  4. Prô o Jorginho tinha certeza de que o pai de Paulinho era ladrão, mesmo sendo politico por que no Brasil, mesmo você tendo uma boa remuneração não teria como ter, tudo que Paulinho mencionou que seu pai tinha e com isso eu afirmo que o pai de Paulinho era ladão.
    Essa é minha opinião.
    Ass. Will 8°c

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  5. prô eu acho que o jorginho tinha certeza que o pai do paulinho era ladrão ja que ele tinha tantas coisas caras e mesmo sendo politico eu acho que nao daria para comprar todas essas coisa, e tanbem politico tem fama de ladrao.

    ass.lucas 8B

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