Capítulo 3
- Com licença Dona Iolanda, mas é que a Dona
Norma pediu para...
Cecília, quase caiu da cadeira, é agora, é
agora.
-
Então, dona Iolanda, a dona Norma pediu para avisar que já estão abertas as
inscrições para a fanfarra.
Ufa, que alívio. Dessa Cecília escapou.
Afinal não estava suspensa das aulas da tarde.
* * *
Cecília abriu os olhos... Queria ficar mais
na cama, não podia...
- Essa cama está tão deliciosa...
Colocou um pé fora da cama,
depois o outro. Ficou de pé! Andou até o espelho.
- Ai meu Deus, ai meu Deus...
Quinze anos e ainda nem beijei na boca... quando terei coragem!
Ah, o grande problema de
Cecília, o grande problema era o fato de
nunca ter sido beijada, nunca, nunquinha. Quinze anos e nada. Quanto mais o
tempo passava, a situação só piorava. Não
que Cecília não tivesse tido oportunidade de ser beijada, houve muitas,
porém Cecília era acometida de um medo avassalador, um medo que aflige muitas
garotas, o medo de errar o beijo e acabar se transformando na chacota de toda a
escola.
No princípio, nem era medo, era
simplesmente vergonha, depois essa vergonha foi se transformando em medo. Tinha
tanta vontade, tanta. Mas na hora "H", sempre recuava.
E, era um tal de treinar na
laranja. Imaginava que a laranja era os lábios do garoto e treinava, treinava,
treinava... Uma prima ensinou outro recurso, encher um copo de gelo e ficar
deslizando a língua entre os gélidos blocos. Cecília treinava, treinava... até
congelava a língua. Era persistente. Mas, não conseguia vencer o medo. Uma vez
na sexta série teve a melhor chance e a
desperdiçou...
Na
sexta série, houve uma greve de professores e nem todos os professores
aderiram, então, os alunos tinham aula
com os professores pelegas* e nas aulas dos professores que estavam em greve,
ficam sozinhos na sala. Nada de aula vaga no pátio ou professor substituto.
Ficam sozinhos na sala. Uns brincavam de stop, jogo da memória, jogo da velha,
outros conversam, outros liam. A greve durou muito tempo, eles sem aulas. Um
joguinho aqui, outro ali. Acabaram saturados. Até que Solange teve uma ideia SENSACIONAL.
-Vamos brincar de "Beijo, abraço ou aperto de mão"?
- Como é essa brincadeira?
-Nossa, Tânia
de que planeta você veio?
-Também não sei qual é. - disse Débora.
- Esta bem, eu explico- continuou
Solange - é assim: eu fico lá na
e escolho uma pessoa, então eu viro essa pessoa de costas para o resto
da sala. E, mesmo que a pessoa esteja de costas, mesmo assim, eu tapo os olhos dela fechados com uma mão e com a
outra, eu vou apontando um por um dos participantes "é esse? é
esse?" Quando a pessoa diz "é"
aí eu digo. " O que você quer dessa pessoa? Beijo, abraço, aperto de mão?
" "Beijo. " Então, eu viro a pessoa e ela vê a pessoa que ela
terá de beijar... ou abraçar, ou dar um aperto de mão.
- E se a pessoa escolhida não quiser
beijar? perguntou Débora.
-Não tem essa, se a pessoa quis
brincar, tem que fazer o que foi escolhido... senão, fora.
Solange estava fechando os olhos de
Sérgio. Sérgio, o mais gatinho de todos. Sérgio, o mais popular entre os
garotos, o mais lindo e ele escolheu quem? Cecília!
- Então, Sérgio, beijo, abraço ou
aperto de mão?
-Beijo...
Sim, ele escolheu beijo...
Cecília mal podia acreditar em
sua sorte.
- Tutti frutti ou hortelã?- perguntou
Solange.
Ah, ainda tinha isso, se a
pessoa escolhesse hortelã era selinho e tutti
frutti, beijo com língua.
- Tutti frutti.
Sérgio virou-se e seu olhar foi
direto para o rosto da pessoa escolhida: Cecília. Cecília leu em seu olhar:
aprovação, satisfação. Cecília exultou.
Cecília sentiu mariposas voando em seu estômago. Sérgio, Sérgio, Sérgio...
Cecília sentiu-se febril, o coração
a mil. Enquanto se dirigia para frente da sala. Um único pensamento: " E,
se eu errar? "
Sérgio veio ao seu
encontro, pegou em suas mãos e quando desceu o rosto para tocar os lábios de
Cecília, ela soltou as mãos suadas das dele e as levou à altura dos seus
ombros e o afastou. Ela viu a mágoa no
olhar dele, mas não pode continuar e o afastou para longe. A turma toda gritava:
"beija, beija" e ele insistiu e ela mais uma vez o afastou. Ela
voltou para sua carteira. Os olhos marejados de lágrimas...
Solange disparou:
- A Cecília não brinca mais.
Vem, Sérgio, vem. Vem escolher outra pessoa.
E foi assim que Cecília viu
Sérgio beijar Simone. Foi assim que ela nunca mais brincou de Beijo, abraço ou
aperto de mão. Foi assim que ela ficou sendo, oficialmente e definitivamente, a
pessoa que fechava os olhos dos outros, perguntando: " É essa, é
essa?"
Alguns rapazes a pediram em
namoro, até o Sérgio, mas o medo de beijar e errar a fazia recusar. Cecília
pensava: "bem que os namorados podiam ter um boooom tempo antes do beijo,
podiam se acostumar um com o outro, mas não, a partir do momento que a
garota aceita o pedido, lá vem o beijo,
lá vem aquele linguão. E, se eu erro o beijo? E se ele rir de mim? E se ele
conta para alguém?"
Cecília se olhava no espelho.
Não era feia. Olhos verdes eram lindos, mas aquelas sardas, aquelas sardas eram
o fim. Usava potes e potes de Sardalina** e nada. Já estava com quinze anos,
nem as sardas e nem o medo de beijar a
deixavam em paz.
- Garota, já está na hora de
enfrentar essa situação idiota.
Cecília abaixou a cabeça
lentamente para o espelho, colocou a língua para fora e ficou beijado o
espelho. Treinando, treinando. Levou o maior susto quando a mãe gritou:
- Ciça, acorda menina...
Tem muito que fazer... Vai acabar se atrasando de novo.
* Nome dado aos professores que furam
greve.
** Creme cosmético que diz tratar do
desaparecimento de sardas.

KKKK dá para escrever um livro as aventuras de Cecília
ResponderExcluirKkkk, estou tentando!
ExcluirHuashuas .. professora vc está ficando ótima .. pode começar a escrever um livro :)
ResponderExcluirEstou escrevendo, Uai!
Excluirprofessora, faz outro capítulo amei esses três, quero continuação ! kkkk
ResponderExcluirDeixa as férias chegarem, estou muito ocupada, agora!
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